31/03/11

Guma, The Self-Conscious Chimp - 1ª página da 1ª versão

Guma, The Self-Conscious Chimp

No exacto princípio dos tempos, quando toda a matéria espacial andava apenas a ocupar espaço, foi convocada pelo Secretário-Geral do Nada a reunião dos mais diversos sindicatos especializados em construção planetária, tendo em vista os objectivos de – literalmente – trazer vida à pletora de vacâncias e, com sorte, arranjar companhia para aquelas tediosas tardes de Outono, fenómeno ainda não criado.

No entanto, os defeituosos métodos de armazenamento dos materiais em uso na altura e um descuidado lançamento de uma beata para o chão dum armazém onde se encontrava a recém-inventada pólvora resultaram no descalabro, fazendo com que tudo caísse por terra…mais ou menos.

Originalmente a mais primitiva forma de vida a inaugurar o planeta Terra, Guma inicia a sua jornada sob a simplificada estrutura de cabeça e cauda deixando os desígnios de formação de membros para uma altura mais conveniente.

E, não menos fascinante, também o meio habitado por Guma mostra a sua quota de evoluções e permutações: uma divisão da primordial ilhota em cinco arquipélagos, todos estes portadores de distintas características ambientais de forma a propiciar não só a diversidade territorial como também a de qualquer forma de vida que neste vivesse.

Com a estrondosa saída dos dinossauros de cena chega a anteriormente referida altura conveniente; cuja conveniência perdurará por vários anos como um dos maiores dilemas dogmáticos de todos os tempos.

Da existência de um ser vivo resulta um leque de necessidades de tamanha força capaz de lançar a espécie humana num furacão de evoluções científicas que, até aos dias de hoje, já o próprio leque acabou substituído por uma ventoinha à base de electricidade.

Guma existe, Guma tem fome, Guma precisa de usar os lavabos. Infelizmente, o empregado não se encontra à vista e os planos para a construção de um WC público ficaram adiados por uma quantia de séculos, tal como o próprio público.


Ricardo Rodrigues 44942

29/03/11

Conto Individual 1ª Versão
Um castelo de areia é trabalho para meia hora: um balde de areia molhada, um punhado de areia seca, uma pá desajeitada manobrada com arrebatamento infantil – é o que basta. É um trabalho solitário, mas feito com orgulho.
Um forte, no entanto, é algo diferente. Exige trabalho de equipa, esforço ininterrupto – e engenho. Não se desfaz com a mesma desfaçatez com que se pisa um castelinho; deve ser construído longe de trilhos de pegadas e rastros de embalagens de gelados, pelo sim, pelo não. Os miúdos afastam-se com as suas pás roxas e ancinhos verdes e os seus baldes de plástico barato; os gritos que os seguem («Põe o chapéu! Anda pôr protector! Não te afastes!») são engolidos pelo marejar e pelos bramidos das gaivotas. Sendo assim, não é de estranhar que o primeiro guincho tenha sido de surpresa e desolação – não de horror – quando o cadáver descolorado, impelido por uma onda repentina, veio derrubar as ameias de areia.
Numa fria sala de jantar inundada de sol, Marcela dobra cuidadosamente o jornal e fita-me, pensativa; com o queixo apoiado na mão, observa-me a tomar café. Olho-a, franzindo a testa, mas a sua expressão meditativa não se altera. Suspiro e pouso a chávena.
“Que tens?,” pergunto, demasiado ensonada para me lembrar que Marcela nunca responde a uma pergunta directa.
Ela sorri levemente e, sem deixar de me fitar, estende a mão para remover a garrafa de whisky do alcance de Jaime, que a fita resignado.
“Já leste o jornal?,” pergunta-lhe, desviando finalmente o olhar de mim.
Jaime grunhe algo vagamente humano.
“A Marta morreu.”
A mente é um lugar estranho. Estou em pânico, claro, o que é, que sabes, como é que o mundo desaparece quando fechamos os olhos, mas não, «A Marta morreu». No entanto, este pânico é uma combustão isolada, compartimentada; registo, em câmara lenta, o efeito da causa: a cara de Jaime, mudando de flacidez bêbada à luz da manhã para um alerta agoniante; os olhos de Marcela, estreitando como os de um gato a ronronar de prazer, à medida que a sua própria mente compartimentada analisa os efeitos das suas palavras em mim.
Ergo as sobrancelhas e levo de novo a chávena à boca, cautelosa para que a mão não me trema.
“Isso não veio no jornal de hoje,” arrisco.
Marcela sorri inocentemente.
“C-como?,” balbucia Jaime.
“Afogada,” responde-lhe Marcela, serenamente.
Suicida, – tal qual um animal tenro prestes a saltar para um tanque de tubarões, a Marcela sempre me intimidou, mas nunca assim – corrijo-a:
“Com o pescoço partido. Atiraram-na para a água... depois.”
A cabeça de Marcela volta-se para mim tão depressa que me sinto zonza, mas não é de bom-tom vomitar à mesa do pequeno-almoço.
“Como é que soubeste?”
“Foram dois polícias a minha casa, anteontem. Fizeram-me perguntas sobre a Marta.”
Marcela faz um estalido com a língua, aborrecida.
“Porquê a ti?”
Encolho os ombros e faço uma careta. Os meus joelhos batem um contra o outro.
“Encontraram a minha morada e o meu nome na agenda em casa dela, como contacto de emergência.”
“Que burra!,“ exclama Marcela, ligeiramente divertida, sobressaltando Jaime.
Encolho os ombros de novo e levanto-me. O Jaime olha para mim; os seus olhos remelosos e injectados de sangue alternam entre fitar-me e fixar um qualquer ponto da sala; geme uma litania de murmúrios desconexos. Marcela comprime os lábios num trejeito juvenil e pede-me o telefone com um gesto.
“Crisântemos ou gladíolos?,” pergunta, enquanto marca um número. “Não, lírios, não é? Lírios brancos. Sim, acho que é adequado. É o usual, não?”
A Marcela tem um talento especial para dizer certas palavras e mudá-las na sua boca até que são as sílabas certas mas a palavra é outra, soa a outra. Como “usual”; hoje queria dizer “vulgar”. Assim como Marta fora “usual” para Marcela. O meu estômago crispa-se; uma película de suor cobre-me a nuca.
“Para quê?,” pergunto, a minha voz sumida de medo. Jaime solta um ganido patético.
“Para que havia de ser, tonta? O funeral. Está aí, na secção de óbitos,” disse Marcela, empurrando o jornal na minha direcção. Afastei-me da mesa com um safanão e corri para fora de casa, uma voz polida e distante a seguir-me, encomendando coroas e ramos.
Com a testa encostada ao rebordo do lavatório e uma mão debaixo da torrente de água fria conto-me uma história, Era uma vez um trio de abutres que apreciava carne humana.
Quando encontrei a Marta pela primeira vez ela ainda não despira aquele olhar arregalado de rato do campo; acho que foi isso que me chamou a atenção. Apresentei-me sem lhe dar tempo de pensar porque é que uma desconhecida lhe falava com tanto à vontade; empurrei-a para a frente da Marcela e do Jaime que a olharam de alto a baixo, franzindo o sobrolho. Marcela soltou uma gargalhada que fez com que Marta corasse, e não lhe prestou mais atenção.
As novidades desfilavam em frente de Marta como taças de champanhe fresco em tabuleiros de prata, e ela bebia cada uma até à última gota. Os seus olhos arregalavam-se na ânsia de devorar o mundo que eu lhe apresentava: nunca percebeu que, na verdade, era ela a ser devorada – porque, na verdade, eu e os meus amigos não passamos de sanguessugas. Pegamos nestes pedaços de almas de anjos, essa partícula que brilha nos olhos de pessoas como a Marta, fazemo-los girar, e girar e girar ao ritmo hipnótico daquilo a que chamamos vida, mas que é apenas uma morte adiada. Quando estamos fartos, quando a Marcela começa a bocejar e eu sinto um formigueiro familiar de impaciência e insatisfação, a música cessa – esprememos esses bocados de brilho nos nossos punhos e esmagamo-los sob os nossos saltos e ignoramos os padrões que o seu sangue desenha no passeio e rimo-nos se eles guincham por misericórdia – a música cessa e amanhã é outro dia, todos os dias.
Há que entender: neste mundo em que vivo, no mundo que é de Marcela e que nunca foi de Marta, ter uma consciência não tem utilidade prática. Isso é importante: há que percebê-lo pois é uma desculpa e uma razão, embora sejam apenas remendos em trapos sujos.
Marta engolia as luzes da cidade e erguia o copo para mais; rodopiava nos vestidos brilhantes que eu lhe arranjava, criando redemoinhos de cores violentas no néon preto e branco das nossas vidas mudas. Ela estendia a mão como uma criança para qualquer coisa com o potencial de a divertir e isso era tudo.
Esmagámo-la. E rimos e rolámos pelo chão sufocados no nosso histerismo, como hienas humanóides – como abutres. Ela queria sugar a vida até à medula – morreu numa noite sem nuvens: lançada ao mar com o pescoço partido. O caso arrastou-se e acabou por ser arquivado por falta de provas.
Semanas depois daquela manhã em casa de Marcela, o Jaime evaporou-se. Passaram-se dois anos: aguardo apenas o dia em que, no teatro ou num dos restaurantes preferidos de Marcela, alguém sussurrará no assento atrás de mim que o estuporado do Jaime Olivier finalmente sucumbiu à maior de todas as ressacas; uma pessoa não pode ser mais sóbria que a morte, e mesmo Jaime não poderá fugir dela para sempre. Marcela ainda é a mesma, claro que sim. Que cinco gerações depois de mim murchem e se desfaçam em cinzas e pó e nada, antes que da sua cabeça brote um único cabelo branco, pois claro que sim.
Nunca mais falámos sobre a Marta. A suspeita é um cancro ulceroso e eu sou apenas humana; as pessoas que, como a Marcela, se habituam a ser adoradas, dificilmente deixam que coisinhas burras e usuais como a Marta afastem os seus idólatras.
Há meses entrei num bar de jazz pela primeira vez em três anos. A Marcela diz que foi apenas uma coincidência; eu chamo-lhe destino – mas não à sua frente. Aquelas luzes púrpuras e negras sempre me agoniaram; o meu coração bate mais rápido ao som daquela música; cada pêlo no meu corpo se arrepia; parecem soldados numa parada, nos meus braços com pele de galinha. É como se o ritmo me tomasse o pulso e o acelerasse com qualquer propósito desconhecido; a minha mente confunde-se com as notas quentes e profundas e os meus nervos não ficam em melhor estado. Marcela diz que tudo não passou disso – de nervos.
Reconheci logo a melodia; Marta adorava-a: sentia pela música jazz uma adoração apaixonada de amantes à distância. Voltei-me para lhe dizer que não podia acreditar que não estivesse ainda farta; senti um espasmo violento – como se todo o meu corpo fosse um elástico demasiado esticado a estalar – quando percebi que estava a conversar com um candeeiro. Corri para fora do bar encharcada em suor e apenas quando cheguei a casa me apercebi de que havia lá deixado o meu lenço vermelho. Foi uma pena: a Marta sempre adorou aquele lenço.
Fez anteontem quatro anos e sete meses desde que «A Marta morreu». Não conto os dias; perco o fio à meada facilmente; falta pouco para que deixe de contar os meses também.
A Marcela decidiu levar-me para a casa do lago; disse que devia antes internar-me num hospício, mas ia fazer uma última tentativa. A Marcela adora o lago – é fácil perceber o quanto ela gosta de algo ou alguém pelo tempo que gasta a insultá-los. Como quando lhe peço a bóia vermelha grande: diz que sou uma tonta preguiçosa e que se a encher de limos nem preciso de voltar para casa, mas empresta-me sempre. É uma mulher magnífica, a Marcela, claro que sim.
Devo ter adormecido, deitada na borracha quente da bóia, com o sol nos olhos e a água a morder-me a ponta dos dedos; a Marcela diz que sim. Devo ter adormecido porque a cara da Marta a olhar-me fixamente do fundo do lago é um absurdo.
A Marcela diz que estou a começar a enervá-la.
Hoje à noite o Jaime bateu à porta. Tinha os olhos vermelhos, barba de uma semana e cheirava como se não visse um duche há ainda mais tempo. Olhou para mim a fungar e começou a carpir como uma velha desdentada; a Marcela bateu-lhe. A marca ficou, vermelho-raiva no seu rosto apatetado. A Marcela é muito forte para uma mulher tão sofisticada; acreditei que era uma deusa quando pela primeira vez a vi.
O rosto da Marta fitou-me do lume da lareira.
Perguntei-lhe. Perguntei-lhe, Marta, perguntei-lhe se te tinha morto. O Jaime tremeu e olhou para Marcela, como que a implorar, mudo. A lenha rangeu e, aos meus ouvidos, soou como ossos a quebrarem.
Diana Paulo, nº 41211

28/03/11

Conto Individual

“Format \C:“ (1ª versão)

Já passou tanto tempo desde a nossa última aventura. Sinto falta daqueles serões perdidos naquelas planícies sem fim e naquelas montanhas vulcânicas. E aquelas batalhas campais em que todos participávamos e limpávamos o sebo àqueles nabos que tinham a mania? Como sinto falta daquelas horas perdidas...

Mais uma vez, estávamos nas ilhas de “Sandstream”. Como de costume, à frente íamos eu e Créme, logo atrás vinha Hugs e na linha da retaguarda estavam Maya e Sun. Já tínhamos feito aquela masmorra várias vezes, mas ainda estávamos na fase de encontrar melhor equipamento, para podermos partir em aventuras mais árduas.
- Sky, ogres às doze! – gritou Sun.

Num instante, Créme lançou-se para o meio dos ogres, captando a atenção deles. Enquanto ela os mantinha distraídos, eu matava-os, um a um, com a ajuda de Sun e Maya. Demos-lhes uma tareia colossal.

Finalmente chegámos ao fim da masmorra. A uns vinte metros diante de nós estava o nosso alvo, o titã da cascata. Um monstro enorme, com vários tons de azul a colori-lo e sete vespas mutantes a rodeá-lo. Então, antes de nos lançarmos a ele, eu perguntei aos meus parceiros:

- Filhos, ainda se lembram da táctica?
- Mais oui, “prrovoco” as vespas e levo-as “parra” un cantinho – disse Créme.
- Já sabes, deitar abaixo inimigos voadores é a minha especialidade. Podes contar com o meu arco e as minhas flechas! – disse Sun.
- Feitiços de área. Entendido! – disse Maya.
- Quem julgais que sou? Óbvio que sei o que tenho de fazer! É só manter o nosso engodo vivo. Ide, usai o vosso florete e trai a vitória ao nosso grupo mais uma vez – disse Hugs.

Tendo relembrado a estratégia para derrotar o nosso alvo, pusemo-la em prática. Créme aproximou-se e soltou um grito de guerra, atraindo as vespas, e defendeu-se com o seu escudo de gelo. Enquanto elas a tentavam envenenar com as suas ferroadas, eu e Sun atingíamo-las com as nossas armas e Maya invocava tremendas tempestades tropicais.

Quando estávamos prestes a livrar-nos das vespas, o titã acordou. Enraivecido, ele dirigiu-se a nós, que estávamos longe de Créme. Ela acabou com as vespas e foi logo a correr em direcção ao titã, enquanto Hugs a revitalizava com magia branca.

- Mangez mon épée, seu “porrco”!
- Tende cuidado, as vossas feridas ainda não foram totalmente tratadas!
- Créme, espera que o meu irmão volte a ter “mana” para lanchar flechas paralisantes! Sun, ainda te falta muito?

Mas ele não respondeu. Voltei-me e reparei que o avatar dele estava parado. Quando ia perguntar-lhe porque estava imóvel, o titã derrotou o nosso grupo. Sem as flechas paralisantes, Hugs não teve tempo para tratar das feridas de Créme, fazendo-a morrer num instante. Logicamente, como os restantes não tinham uma defesa tão elevada como a dela, fomos mortos, um a um, numa questão de segundos.

Furiosa, fui até ao quarto do meu irmão. Ele estava sentado ao computador com um ar estupefacto. Eu aproximei-me dele e comecei a gritar.

- Alphonse Ballista, que raio estavas tu a fazer?!
- A culpa não foi minha, o PC é que bloqueou! Se calhar não devia ter deixado o “BitTorrent” ligado.
- O quê?! Al, tu sabes muito bem o “BitTorrent” deixa o computador lento! Tu sabias muito bem que hoje íamos voltar a derrotar o titã!
- Ó Vanilla, desculpa, esqueci-me.

Estava mesmo fula, parecia um touro que acabara de ver um pano vermelho. Empurrei-o da cadeira e inseri o comando para formatar o computador dele. Disse-lhe para ele não me dirigir a palavra na próxima semana e voltei para o meu quarto.

No dia seguinte, quando eu e ele estávamos a voltar da faculdade, viemos a discutir. Eu gritava com ele por ter deixado o computador bloquear a meio do jogo e ele gritava comigo por lho ter formatado. A nossa discussão tornou-se agressiva ao ponto de nos empurrarmos um ao outro, mas eram empurrões muito leves. Contudo, a dada altura, exaltei-me demasiado e dei-lhe um empurrão que o fez cair no meio da estrada.

Desse dia, só me lembro da rapidez a que o carro passou diante de mim. No fundo, quando formatei o computador, também formatei o meu irmão...

estudante 37878

26/03/11

1ª versão do conto individual

À hora do chá

Quando as casas eram brancas e os homens usavam bigode, os habitantes da grande casa da vila bebiam chá sempre às 5h25. Nunca antes ou depois. A vila era pequena, nada mais que uma longa rua com dois cafés, um restaurante e uma mercearia, para além das vivendas. Ao fim da rua a terra batida misturava-se com a areia da praia. A grande casa, por ser alta, tinha vista para o mar que era azul e calmo durante todo o ano, algo que fazia uma grande confusão à Dona Maria, que era do norte e não estava habituada. No Verão, a areia da praia quase que não era visível, tantos eram os que ali se deitavam à espera que a sua palidez desaparecesse para dar lugar ao vermelho ardente. A Dona Maria, nunca ia à praia, ela tinha de fazer o chá, e o chá tinha de estar pronto às 5h25 nem mais nem menos. A essa hora, o chá, a mesinha de madeira da sala e as bolachas de chocolate e caramelo (as preferidas da Mercedes) tinham de estar prontos. Portanto não havia tempo para ir queimar a pele ou molhar os pés. Se algo não estivesse pronto, pobre Dona Maria, seria como da outra vez, em que por causa da Mercedes, esteve a limpar os pedaços de chocolate do chão e não conseguiu ter o chá feito à hora certa, até já passavam das 5h32 quando a mesa ficou finalmente pronta. Nesse dia, a senhora Cecília não bebeu chá, saiu e foi para a praia. No parecer da Dona Maria, a senhora Cecília passava demasiado tempo na praia. E a necessidade de ter o chá às 5h25 era simplestemente ridícula.
Nestes dias de início de Primavera, a Mercedes ia para a rua de vestido curto, mas voltava sempre a meio da tarde à procura de um casaco.
- Não, Maria! É aquele amarelo!
- Oh menina Mercedes, mas esse não de Verão?
Mercedes rolou os olhos da maneira que tantas vezes fazia (mas nunca na presença de Cecília) - Maria, não quero saber se é de Verão ou não! Quero esse!
- Eu também não quero saber! É a menina que depois fica com frio, não sou eu! Mas de qualquer maneira esse casaco não está aqui, se calhar é a senhora Cecília que o tem no quarto.
Mercedes murmurou qualquer coisa que a senhora do norte não percebeu e saiu do quarto depois de vestir um casaco azul marinha que tinha em cima da cama.
Lá fora já estava a ficar frio e vento e a vontade de ir comprar um gelado rapidamente desapareceu. Foi até à praia, descalçou os sapatos, que era amarelos tal como o casaco que queria vestir. Cecília estava deitada na areia um pouco mais à frente. Ainda não era Verão e ela já ali estava, pensou Mercedes. Realmente Cecília parecia não sentir o vento, tinha um fato de banho verde menta, ficava bem na sua pele que era mais escura que a pele de Mercedes. Na verdade as duas irmãs pouco tinham em comum, tanto na aparência como na maneira de ser. Mercedes era ruiva, o seu cabelo era longo e muito encaracolado, todo o seu corpo estava coberto de sardas, os grandes olhos eram muito verdes. Era muito magra e de altura média para a sua idade. Pintava as unhas de vermelho todos os dias mas tirava no Verão, nessa altura pintava de azul claro (a sua cor preferida).
Cecília, por outro lado, era morena. Os cabelos eram lisos e longos, normalmente usava uma trança. Não tinha os olhos nem castanhos nem verdes, no entanto tinha. Era mais alta que a irmã, mas também era mais velha, (já tinha passado os vinte). A Maria e todos os da vila dirigiam-se a ela como senhora Cecília porque a outra senhora da casa já não vivia lá.
Mercedes decidiu ir ter com ela… também gostava do mar e da praia, talvez não tanto como a irmã. A única coisa que não gostava era de sentir a areia nos pés ou de ficar com areia nos sapatos e na roupa, Cecília não se importava com isso.
- Não tens frio?
- Não… a areia está quente.
Mercedes riu-se de forma infantil - Só se for aí onde tu estas deitada!
- Talvez. E tu? Não tens frio? Esse vestido não é curto demais para este tempo?
Mercedes olhou para o vestido e alisou-o com as mãos antes de falar no seu tom de criança que sabe tudo:
- Não me importa!
Cecília que tinha estado este tempo todo de olhos fechados, olhou a irmã de alto a baixo e sorriu. Fechou os olhos e voltou a virar a cabeça para o sol. - Hoje está um bom dia.
Mercedes foi até à água, só para sentir que estava demasiado fria, nem a Cecília ia ser capaz de tomar banho assim e no entanto o cabelo de Cecília estava molhado. A irmã mais nova sentiu um arrepio e foi para casa.
- Já de volta? - a Dona Maria estava na cozinha a pôr as bolachas num prato.
- Sim!
- E a senhora Cecília?
- Está ali na praia, este ano começou cedo! Está um frio terrível!
Dona Maria ignorou a contradição da pequena Mercedes e continuou com o que queria dizer - Podia ir chamá-la?
- Eu? Mas porquê? - Mercedes não gostava de fazer coisas porque as tinha de fazer.
- Hoje temos visitas. – disse com um sorriso.
Mercedes correu para a sala, sentados um ao lado do outro como os casais se sentam, Teresa e Duarte esperavam o chá das 5h25.
- Mercedes! Estás tão grande! - A voz de Teresa era fina, talvez demasiado fina e portanto um pouco irritante, pelo menos na opinião honesta de Cecília. Mercedes não pensava o mesmo, muito pelo contrário, para ela a Teresa era o exemplo de tudo o que ela queria ser: magra e com um marido muito bem parecido. A opinião de Mercedes podia ser infantil mas era a verdade de forma simplificada, a Teresa não era mais que isso.
-Teresa! Pensava que nunca mais nos vinhas visitar! - Mercedes abraçou a irmã mais velha, ignorando Duarte.
- Bem já tinha algumas saudades das minhas irmãs. - Teresa sorriu e penteou o cabelo castanho com os dedos de forma a que não lhe tapasse a cara, o que acontecia várias vezes.
- Olá Mercedes, está tudo bem? - a voz de Duarte era rouca, forte; da sua boca nunca saiam palavras sem propósito. Os olhos verdes, ainda mais verdes que os de Mercedes, penetraram o olhar da jovem criança.
- Sim. – a criança respondeu calma e rapidamente, desviando o olhar. Ela não gostava de Duarte, para além da sua aparência física não conseguia ver qual era o interesse que Teresa tinha nele. Cecília via toda aquela situação de forma contrária e ao entrar na sala, apenas com um fino vestido de praia e a pele um pouco mais morena, a única coisa que disse ao ver a irmã primogénita com o marido foi - Olá, parece-me que estou um pouco atrasada, peço desculpa.
Já sentados à mesa, Duarte não tirava os olhos de Cecília e Mercedes não tirava o seu olhar desconfiado de Duarte, como sempre durante a infância das irmãs, Teresa parecia estar num mundo à parte, afinal a ignorância é uma bênção. Os olhos de Cecilia estavam cravados no chá que bebia.
- Bem agora que já aqui estamos todos acho que podemos contar o que viemos contar, não é? – Teresa acariciou a perna de Duarte e olhou para as irmãs.
- Sim, acho que sim. Tu é que sabes Teresa.
- Estás grávida? – gritou Mercedes – É isso não é!
A cara de Teresa não mentia. – Sim! É isso mesmo irmãzinha.
Cecilia olhou para Duarte que desviou o olhar.


Quando a areia da praia quase chegava à grande casa, o chá era tomado à hora em que as jovens irmãs se encontrassem prontas, o que poderia demorar visto que a mais nova tinha apenas 10 anos.
- Dona Maria, hoje vamos ter a visita de um jovem. A Teresa já vai fazer 18 anos e ainda me parece que esteja longe de sair de casa. Se não fosse aquela sua voz tão fina…
Magda virou as costas e subiu até ao quarto da filha do meio. Cecília estava a preparar-se para sair.
- Hoje não podes ir à praia. Nem respondas Cecília, ainda nem estamos em Abril. Para além disso, talvez seja hoje o dia em que a Teresa arranja um marido. Portanto não quero que a trates mal em frente ao pretendente.
Cecilia não respondeu, quando a mãe saiu do quarto tirou o vestido de praia e o fato de banho e trocou-os por um vestido azul escuro demasiado curto para a ocasião.
Quando a campainha tocou, às 5h25, as três irmãs (cada uma com um vestido mais curto) desceram a correr as escadas e foram-se sentar entre risadas no sofá da sala de estar. O jovem que entrou na grande casa era alto e muito bem parecido, com uns olhos verdes intensos que rapidamente se dirigiram para Cecília. Duarte não poderia ser responsabilizado, ao lado da irmã do meio, Teresa parecia uma criança ainda em formação.
- Boa tarde Duarte, espero que tenha feito uma boa viagem até aqui.
- Sim, obrigada Dona Magda.
Magda apresentou as filhas dizendo apenas o nome e não apontando, nunca pensado que Duarte achava que a mais velha era Cecília.
- Bem agora vou deixar-vos aqui para se conhecerem melhor, mas a Teresa não deve ficar na presença de um rapaz sem estar acompanhada, portanto assim fica já a conhecer as irmãs.
Magda saiu e os jovens ficaram a falar enquanto bebiam chá e comiam bolachas.
- Eu adorava viver numa casa ao pé da praia. – Duarte estava completamente apaixonado, nunca esperaria gostar assim tanto de uma rapariga que nunca tinha visto. Só queria que aquele encontro acabasse para ter outro e outro.
- Sim, é maravilhoso. – respondeu Cecília com um sorriso que poucas vezes se via.
- É um bocadinho irritante quando a casa começa a ficar cheia de areia. – disse Teresa na sua voz fina soltando um riso.
- Eu também acho. – respondeu Mercedes.
Quando Magda voltou à sala poucas horas depois Duarte levantou-se e em voz alta disse que não queria esperar mais, pois não havia quaisquer dúvidas no seu coração, Teresa era a rapariga para si e visto que o pai já não estava presente era então a Magda que ele pedia a mão da filha mais velha. O coração de Cecília caiu até ao estômago e sem querer abriu a boca e arqueou as sobrancelhas, quando Teresa se levantou-em êxtase, o mesmo aconteceu a Duarte.
- Eu estou tão feliz! Nem acredito que sentes o mesmo que eu sinto.



Após o chá e as novidades as irmãs despediram-se à porta, Duarte e Cecília apenas apertaram as mãos mas foi o bastante para que os seus corações batessem mais rapidamente, mesmo que só por alguns segundos. Teresa entrou no carro, já Cecília estava de volta em casa. Mercedes puxou o casaco de Duarte e disse-lhe ao ouvido:
- Se tu fosses uma rapariga e a Teresa e a Cecília fossem rapazes eu diria que o filho não era da Teresa.



aluno 37958

Conto Colectivo - Parte IV

Sobressaltou-se e deu um passo atrás, franzindo o sobrolho. Imitei-lhe os gestos: não era ele. Uma centelha de lucidez fez dissipar o nevoeiro que me nublara a razão e levara a ver naquele homem o retrato vivo de Miguel. Esbocei um sorriso constrangido e afastei-me.

Ainda aturdida, percorri o perímetro, penetrando por entre o bulício e perscrutando cada tenda por que passava. Encontrei a barraca da cigana na periferia da feira, meia escondida, como se espreitasse por trás de um carrossel. À entrada, uma mulher jovem segurava uma criança irrequieta pelo braço, tentando limpar-lhe a boca suja.

“Desculpe, procuro uma senhora que costumava ler a sina aqui.”

A mulher olhou-me com desconfiança e soltou o miúdo.

“Ah, a minha mãe. Não ‘tá não. Ela agora deu em ler a sina lá no circo.”

Tentei saber mais, mas ela virou-me as costas, voltando ao interior da barraca. Pus-me a caminho, perguntando aqui e ali pelo circo da cidade. Quando o encontrei, ignorei o aviso do vendedor de bilhetes de que o espectáculo já estava a terminar e entrei. Iluminada por um holofote, a cigana debitava, com as mesmas palavras que para mim usara, o destino de um qualquer ingénuo. Ri-me.

Os artistas surgiram de braços abertos, agradecendo ao público com sinceras vénias. Dei uma irónica salva de palmas e levantei-me, determinada a confrontar a falsa vidente. Sem pudor, dirigi-me à zona das caravanas e esperei até vê-la entrar para uma delas.

Bati à porta. Não ouvindo resposta, entrei sem que me convidasse. Vi-a em frente ao espelho, retirando um véu escuro que revelava um rosto sulcado de rugas. Cruzámos olhares no espelho.

“Quer que lhe leia a sina, é?"

“Para dizer o que me disse há vinte anos atrás? Agradeço, mas não. Você estava enganada,” disse-lhe calmamente.

“E menti?”

“Diga-me você.”

Deu um sorriso de dentes podres e anunciou:

“Tenho fome.”

“Não desvie o assunto. Explique-se.”

“Sim, mas tenho fome,” insistiu a velha.

Sem outra saída, levei-a à tasca mais próxima. Pediu e repetiu o prato do dia, comendo com sofreguidão. Quando acabou, lambeu os dedos, soltando um arroto satisfeito.

“Você estava enganada, sabe?,” arrisquei, já pouco segura.

Ela levantou-se, pegando no chapéu de palha e no cajado que trouxera consigo. Os seus lábios sumidos rasgaram-se num esgar desditoso.

“Não me parece.”


Grupo 4 - Diana Paulo, Joana Barão e Márcia Bernardo

25/03/11

Conto individual-1ª versão

Uma noite no Demi

No Sábado passeámos de carro, ontem fomos ao parque e hoje é a despedida do Mário. No Domingo vamos ao rio, mas já sem o Mário que terá partido.

Ele ainda não apareceu, foi a Cascais comer um cone de morango, deve estar a chegar.
Vou pedir o bitoque, acredito que é a melhor opção, o Mário pedirá a espetada de lulas, eles não sei, não faço ideia, talvez peçam um arroz, dá para dois.

O meu relógio custou 20 euros, é preto e tem um botão que ilumina o visor. O do Mário custou 500, é um Raymond Weil.

Ontem não vi o Mário. Fui ao parque e desenhei o arvoredo, ficou feio, rasguei o desenho, já não o vou oferecer ao Mário, comprei-lhe um presunto, de porco preto.

O Mário uma vez comeu a minha namorada, acho eu, não tenho a certeza, penso que sim.

-Tavas por quem na guerra civil espanhola?
-Não é ‘tavas’ é ‘estavas’. Estava pelo Franco.
-Cabrão do fascista. O que quer dizer mimesis?
-Não sei. Acho que é um bolo.


aluno 37965

24/03/11

Conto Individual - Marcos Guedes

Ulisses

23/03/11

conto individual -ana faia

Existem amores que duram vidas
Um arrepio! Um arrepio foi o que sentiu no momento em que olhou a fotografia publicada na Internet. Na pesquisa que fizera sobre catástrofes inexplicáveis, Luiggi não compreendia porque haveria de parar naquela foto tão aterrorizadora e muito menos entendia o porquê daquele calafrio que lhe provocou um tão mal-estar pelo corpo. Leu a notícia, mas esta apenas mencionava que quatro pessoas tinham morrido e que o choque frontal foi tão forte que era impossível a sobrevivência de qualquer um dos passageiros. O mesmo tinha ocorrido anos antes do seu nascimento. Aparentemente, nada tinha a ver com este acidente.
Eram duas da manhã, estava debruçado e concentrado no ecrã do computador, sobre a mesa da sala. Foi interrompido na sua pesquisa pela internet, quando a chuva batia violentamente na vidraça. Espreitou através dela, apenas presenciou uma rua deserta. Alguns segundos depois, ouviu alguém arranhar-lhe a porta de entrada. Sentiu um novo arrepio que o paralisou. O coração batia fortemente e os seus movimentos foram extintos, até chegar à conclusão de que tudo seria da sua cabeça e deveria deixar-se destas coisas assustadoras que tanto o atraíam. O barulho não cessou: pelo contrário, intensificou! Espreitou pela porta, mas não viu ninguém. Num acto de coragem abriu-a violentamente. Viu um vulto pequeno invadirlhe a casa e dois olhos aterrorizados fitavamno.
O pêlo pingava e estava magro. Era apenas um gato abandonado que lhe irrompera casa adentro. Tentou colocálo na rua, mas sentiu uma enorme compaixão por estes olhos tristes e sem vida. Decidiu darlhe abrigo. Seria a companhia ideal para um homem solteiro que se interessa por coisas que ninguém percebe. Havia qualquer coisa naquele gato que não conseguia descrever. Luiggi não sabia o quão importante este seria para algumas explicações.
Durante uma semana sucederam-se episódios um pouco inexplicáveis e, por vezes, quando fazia uma pausa no seu trabalho, recordava a fotografia que tinha encontrado na sua pesquisa.
Um dia, ao regressar a casa, viu um miúdo novo na rua. Nunca o vira por ali. Pensou que se teria mudado com a restante família, há pouco tempo. Durante duas semanas, exactamente no mesmo sítio, debaixo de uma árvore, este sorria-lhe aquando a sua entrada no pequeno apartamento que partilhava como o gato Speculus. Tinha sempre a mesma roupa, a mesma expressão e aparecia sempre no mesmo sítio. Estranho, bizarro e sem justificação era o que ocorria a Luiggi sobre aquele miúdo sem nome. Não percebia de onde surgia e porque nunca o tinha visto com nenhum membro da sua família ou sequer a brincar com os outros miúdos do largo. Apesar de todos estes miúdos de imaginação aguçada, que se entregavam a brincadeiras constantes pela areia do largo, chamarem o pequeno miúdo sem nome para junto deles.
Um dia, de madrugada, Luiggi acorda de um pesadelo onde ele mesmo aparecia com face a escorrer sangue, dentro do carro que surgia na fotografia que vira semanas antes. Não entendia porque é que a sua imaginação remetia incansavelmente para aquele carro desfeito. De certa forma, parecia que esta o perseguia sem qualquer explicação.
Acaba por se levantar e dirigir-se à cozinha com a intenção de beber água para acalmar o espírito, detém-se em Speculus. O gato estava sentado num braço do sofá, a olhar fixamente para a rua. Luiggi, espreita fugazmente, como que receando o que iria presenciar. Encontra apenas a uma rua iluminada e vazia. Respira fundo! Há semanas que sente um peso na alma. Assiste a acontecimentos que o transportam para algo sobrenatural. E relembra-se de que tudo começou logo após aquela fotografia.
Passaram semanas desde esse constatar de factos e Luiggi encontrou o seu gato Speculus durante todos estes dias no mesmo lugar, a qualquer hora da noite a que se levantasse. O mais estranho era que este fenómeno apenas era presenciável durante a noite, porque de dia Speculus nem se chegava junto da janela. Luiggi sentia-se cada vez mais angustiado e amedrontado com todo este conjunto de situações. Foi então que se relembrou do miúdo sem nome. Os encontros com esta criança à entrada do seu prédio revelavam-se os mais intrigantes e sem uma explicação plausível.
Luiggi saiu do trabalho por volta das 16h37min. E decidiu caminhar até à avenida principal, a fim de comprar alguns alimentos para si e ração para Speculus. No momento em que entrou no supermercado viu uma cena que preferia não ter presenciado: um barulho de latas a esmagarem-se e um travão bem afincado no asfalto da estrada; antecederam dois carros desfeitos de frente um contra o outro. Ouviram-se gritos, gemidos e pessoas em pânico. Luiggi olhou com toda a atenção e sentiu uma dor forte no braço e na cabeça, como se estivesse dentro de um daqueles carros.
As ambulâncias, ao fim de poucos minutos, chegaram. Olhou o relógio: eram 16h 57min. Dirigiu os seus olhos para o aglomerado de gente em redor das mesmas que queriam furar o caminho para avançarem com os acidentados. Foi aí que presenciou a pior das cenas, quando todos já iam tomando o seu caminho…
Chegou a casa, largou os sacos e ficou incrédulo. Não queria acreditar ao que assistiu. Agora tudo começava a ficar nítido diante dos seus olhos. O porquê da fotografia e do miúdo. Só não entendia a dor forte no braço e na cabeça, e como estes estavam ligados a todos factos que vivera. Foi interrompido no seu raciocínio pelo ar assanhado de Speculus. O gato comportava-se de uma forma estranha. Estava com o pêlo eriçado, no sofá em que passava toda a noite, a encarar a janela que dá acesso ao pátio, onde as crianças brincam. Luiggi, bastante assustado com tudo o que havia observado, espreita pelo vidro e vê o miúdo sem nome a dizer-lhe adeus, com um meio-sorriso e um fio grosso de sangue a escorrer-lhe pela face. Neste momento, Luiggi sente o coração bater aceleradamente, ficando atónito. Quando a imagem desaparece, tenta sair de casa. Abre a porta, mas Speculus impede-o, envolvendo-se nas suas pernas. Parou e sentou-se no sofá a tentar raciocinar. Pensou que a melhor solução seria pegar no computador e ver os contornos do acidente que envolviam aquela fotografia. Porque tinha a certeza de que aquele miúdo estava associado a ela.
Durante duas horas procurou toda a informação que havia sobre o tal acidente. Mas pouco se sabia. Apenas o que já havia lido. No entanto, ficou a contemplar a mesma foto. Viu um pequeno braço de criança desmaiado. De repente sentiu uma ventania na sua cara. Olha por cima do computador e vê o miúdo sem nome fitá-lo. Um momento passou, Luiggi não sabe dizer quanto tempo. Mas nem a criança proferiu palavra alguma, nem ele. Esta apenas fez surgir a cara ensanguentada e lhe estendeu a mão como um pedido de ajuda. Luiggi já não sentia medo mas um sentimento de compaixão. De súbito, após o desaparecimento do miúdo sem nome, sentiu uma breve saudade, não sabe do quê, apenas sabe que a sentiu quando olhou para a criança.
Os dias correram e nada de factos estranhos nem da criança. E já nem Speculus dormia em cima do sofá ou eriçava o pêlo. Apenas um papel escrito que lhe aparecera em cima da mesa, ao lado do computador, que antes de sair não estava lá. Apenas esse pequeno papel foi a mais estranha ocorrência que lhe sobreviera depois do seu encontro com o miúdo sem nome.
Abriu-o e leu-o. Não tinha remetente, não tinha destinatário. Apenas uma frase: “Tenho saudades dos tempos em que brincávamos juntos”. Luiggi sentiu uma lágrima a escorrer-lhe pela face. Teve uma breve recordação de onde conhecia aquele miúdo. E logo a fotografia fez sentido. Era o seu irmão, mas nessa altura em que ainda eram irmãos Luiggi, não era a pessoa que hoje é. Era o menino que viajava ao lado do miúdo sem nome, naquele dia em que partiu para a luz eterna, quebrando a promessa que haviam feito um ao outro, nesse mesmo dia: “Vou estar sempre contigo, sempre”. Mas aquele dia fatídico separou-os e o miúdo sem nome apenas procurava cumprir a promessa que havia feito ao irmão (naquela altura Francesco) de nunca o abandonar. Mesmo Francesco tendo seguido o seu caminho para a luz, o miúdo sem nome ficou na terra à espera de que o irmão o viesse buscar (até que ele próprio o encontrou).
- Agora já podes seguir o teu caminho, miúdo sem nome…E um dia irás novamente encontrar-te comigo, aqui bem na terra onde o sol se põe e o horizonte toca o mar. Irás viver novamente ao meu lado e iremos prometer nunca nos separarmos.
Existem amores que duram vidas…
Ana Faia 39015
Estudos Artísticos

22/03/11

Conto Individual de Maria Isabel Burgo

DESCOBERTA
Ana refugiou-se em casa e imediatamente escrevinhou o que acabara de acontecer.
Valera a pena o coração aos saltos, o receio de ser surpreendida. A seu ver, não cometera exactamente um crime… mas não deixara de ser uma intrusão em casa alheia. O que descobrira confirmava as suas suspeitas!
Releu cuidadosamente tudo o que anotara desde que tivera a sensação estranha de que algo estava errado com o vizinho. Era o mesmo velho de roupas escuras, casaco coçado e chapéu fora de moda que, agora, usava sempre. Mas algo estava diferente… ou talvez estivesse a ficar paranóica! A sensação era tão forte que lhe causava desconforto físico, agravado pelo facto de não conseguir descortinar a razão das suas desconfianças. Algumas vezes acordava com barulhos estranhos provindos da casa ao lado e já não conseguia adormecer. De vez em quando, de livros abertos sobre a secretária, o olhar desviava-se para a janela, espiando a rua…
Naquele fim de tarde, viu-o sair e, num impulso, resolveu tentar entrar em casa dele. Esperava que atrás dos estores corridos, alguma janela estivesse aberta para arejar o interior abafado. Saiu pelas traseiras e saltando o pequeno muro que separava os dois quintais, investigou porta e janelas. Tudo fechado! Usando a agilidade que sempre possuíra, subiu para a pequena varanda do primeiro andar. Preparada para a desculpa de lhe ter parecido ouvir um pedido de socorro vindo do interior, levantou o estore e entrou pelas portas abertas.
O quarto ascético, com uma cama e móveis antigos, não a surpreendeu e para além da imagem do quadro que a olhava acusadoramente, nada havia que lhe chamasse a atenção. Fora na casa de banho ao lado que fizera a descoberta. Barbas brancas postiças! De repente, percebera. Não era a barba, que parecia autêntica, era o andar! O que estranhara era o andar flexível, diferente do habitual caminhar cansado e lento.
Agora, em casa, as interrogações sucediam-se. Seria alguém a fazer-se passar pelo velhote? Teria ele feito algum tratamento milagroso? Mas, nesse caso, o que o levaria a fingir-se mais velho? Não seria sensato contar as suas suspeitas baseadas em meras impressões, não poderia aludir às barbas postiças sem revelar como as descobrira e, de qualquer modo, não é proibido usá-las…
Ana acordou assustada. Não tinham sido os ruídos estranhos que já tinham parado. Tivera um pesadelo com o quadro do vizinho. Não recordava bem o sonho, mas a gravura, aparecia nítida, com todos os pormenores. Num cenário que se desenvolvia em três níveis de altura mas também em profundidade, o personagem central, de braços cruzados, ladeado por duas figuras angélicas, afinal não a olhava, como lhe parecera, olhava através dela, através de si próprio. Perturbada, procurou na internet, depois em livros de arte mas nada descobriu.
Tinha de voltar àquela casa!
Atenta aos movimentos do vizinho, depressa se lhe deparou uma oportunidade que não perdeu. Desta vez arriscou descer ao andar de baixo. Nem as roupas gastas, nem o exterior modesto da casa semelhante às do bairro, nem mesmo o quarto que investigara, nada a preparara para o que presenciou. Mobiliário requintado, tapeçarias persas, estatuetas, quadros antigos, tudo reluzindo numa limpeza meticulosa. Numa vitrina cheia de cristais, destacava-se um ovo dourado decorado com gemas brilhantes numa pequena carruagem puxada por um anjo. Não devia ser, não podia ser um ovo Fabergé…
Havia apenas mais uma sala, a biblioteca. Diversas gravuras alquímicas esclareceram-na acerca da natureza da que vira no quarto. Para além de alguns livros clássicos nas línguas originais, havia sobretudo livros e tratados de alquimia. Mas onde estava a escada para a cave? Ela sabia que todas aquelas casas tinham cave. Só lhe restava procurar na cozinha. Lá estava, disfarçada num painel no fundo da despensa! Começou a descer as escadas e vislumbrou na obscuridade uma espécie de laboratório com bancadas, retortas, bicos de Bunsen. Quase imaginou o velho sentado no banco de tripé, à luz bruxuleante das velas e do fogo que aquecia as retortas. Hesitou em continuar devido ao cheiro desagradável misturado com os incensos que impregnavam o resto da casa. Um barulho na entrada da casa, fê-la correr de volta à cozinha. Sem tempo para sair por onde entrara, experimentou a porta da cozinha que dava para as traseiras. Trancada! Correu para a despensa.
Suada, o coração acelerado, sentou-se no chão, esperando, a cada momento, o abrir da porta do compartimento. Quem entrara, subiu as escadas e a casa ficou silenciosa. Ana acalmou-se gradualmente. Ainda sem coragem para sair dali, ficou a pensar no que diria o irmão se fosse apanhada e entregue às autoridades. O irmão era o único familiar que lhe restava e, embora longe, continuava a proporcionar-lhe a possibilidade de prosseguir os estudos. Desde que tinham perdido os pais, assumira a responsabilidade da sua educação. Agora, na faculdade, as despesas tinham aumentado sobretudo devido à necessidade de se mudar para a capital e ter de alugar uma casa.
Desejou estar em casa… A casa ainda tão vazia! Queria comprar, pelo menos, um sofá e uma televisão… Talvez arranjando uma colega com que partilhasse as despesas... Mas tinha de ter cuidado com quem escolhia … A maior parte dos amigos da faculdade viviam com os pais e não viam muitas perspectivas de mudarem a sua situação nos tempos mais próximos. Na verdade não tinha muito amigos a não ser que contasse com os da net.
Pensando nisso, seria espectacular contar-lhes toda a aventura que estava a viver. A aventura não era assim tão perigosa, o susto é que não a deixara lembrar-se da desculpa já elaborada, caso fosse surpreendida. No entanto, não seria necessária. Há muito que não se ouviam ruídos, o vizinho decerto já estava a dormir. A questão é que não poderia sair pela varanda por onde entrara. Experimentaria a porta principal e se também estivesse trancada sairia por uma janela.
Levantou-se disposta a sair imediatamente. Notou que tinha parte do corpo dormente devido à prolongada imobilização. Procurando não fazer ruído, começou a abrir a porta da despensa, mas hesitou. Afinal ainda não tinha resposta para as suas dúvidas. As mais diversas fantasias atravessavam a sua mente. Talvez a resposta estivesse mesmo ali perto, na cave… E se o vizinho tivesse inventado algum remédio milagroso de rejuvenescimento? Não seria obrigação dele compartilhar a sua descoberta com o mundo? Também tudo poderia ser produto da sua imaginação… Quem sabe não teria sido actor e por isso tinha as barbas falsas que encontrara… Mas o que vislumbrara na cave não deixava de ser misterioso… E todas os objectos caríssimos que evidenciavam uma riqueza nada consonante com a vida que aparentava fazer? Mais, o que responderia, no chat, quando lhe perguntassem por que não investigara?
Decidida, abriu o painel e desceu as escadas. Pensou abrir a luz mas não se atreveu. Após se habituar ao lusco-fusco proporcionado pelas pequenas janelas colocadas na parte superior da parede que dava para as traseiras, começou a ver tudo distintamente. Chamou-lhe a atenção, numa parte mais recôndita, o chão destruído e vários sacos e volumes encostados a um canto. Dirigiu-se para lá.
Um ruído de passos fê-la estacar. Não tinha onde se esconder! Voltou-se.
À sua frente estava um desconhecido, ou melhor, o vizinho. Só que, em vez de ter a idade indefinida do idoso, aparentava cerca de quarenta anos. Viu a expressão carregada no rosto bem barbeado…
O desconhecido olhou-a pensando no velho tio, rico e excêntrico cuja morte já desistira de esperar. Agora, iria ter mais um corpo para enterrar! Ainda bem que ainda não remendara o cimento que partira no chão. Mais uns tempos a fazer-se passar pelo tio, depois bastaria mudar de casa e ninguém estranharia a ausência deste. Jamais seria descoberto!
Maria Isabel M. S. de Burgo nº41435

21/03/11

Conto colectivo - Parte III

Era o dia da abertura da feira!
Mais abaixo, destacava-se um pequeno anúncio:

Estás só!
Mas não é demasiado tarde. Procura-me!
É mesmo contigo.
Aquela que avisa, aquela que ajuda,
A cigana da feira.

Era comigo. Só podia ser comigo! Não que acredite nestas coisas, mas o certo é que tinha vindo para Guadalupe, obedecendo a um estranho impulso. Nem imaginava que a feira ainda existia. No entanto, ali estava ela, ao fim de tantos anos, onde tudo começara…
Iria lá nem que fosse para confrontar a cigana, dizer-lhe que se enganara. Por outro lado, ela não estava completamente enganada... E quem sabe, talvez o encontrasse...

Preparei-me para sair. Sabia exactamente o que vestir! Já não tinha vinte anos, mas estava fora de questão usar a roupa sofisticada com que enchera o armário... acabei por escolher o vestido verde que comprara em Marrocos e umas sandálias confortáveis. Olhei-me ao espelho e não desgostei do que vi. Pensei em voltar à cor preta original do cabelo e deixá-lo crescer um pouco... Saí.

Não demorei muito a chegar ao meu destino. Parecia que o tempo não tinha passado por aqueles lados. A feira permanecia igual. Ao entrar, vieram-me ao pensamento todos os bons momentos que ali tinha passado com o Miguel.

Percorri cada recanto da feira na busca do meu sonho, mas não estaria eu a sonhar demasiado alto? Só queria voltar a senti-lo uma vez mais nos meus braços.

Não podia acreditar que ele estava ali mesmo a admirar um lindo colar de pedras vermelhas. Com o coração aos pulos, aproximei-me dele e sussurrei-lhe ao ouvido: “Até que enfim que te encontrei!



Ana Catarina, Filipe Marques, Isabel Burgo, Tânia Almeida

Leitura dos contos individuais

23 de Março
Ana Faia +  Diana Paulo +Joana Barão + Maria Isabel Burgo

25 Março
Cristina Branco + Marcos Guedes + Filipe Marques + Hugo Baptista

30 Março
Rodrigo Pereira + Filipe Gomes + António Seabra + Maria Inês Sousa

1 Abril
Joana Maria + Sara Fernandes + Denilson Freitas + Vânia Netas + Cláudia Ramalhosa

6 Abril
Helga Costa + Rafael Martins + Susana Correia + Fábio Cruz + Cátia Ferreira

8 Abril
Pacheco Eduardo + Diogo Esteves + Márcia Bernardo + Rita Bárbara

13 Abril
Ricardo Rodrigues + Ana Zhang + Luís Filipe + Bruno Jacinto + Soraia Gonçalves

15 Abril
Pedro Candeias + Joana Leotte + Tânia Almeida + Paulo Rodrigues

Grupos Redacção Conto COLECTIVO

GRUPOS

1) Fábio Cruz, Pedro Candeias, Susana Correia

2) Ana Faia, Joana Maria Hugo Baptista, Soraia

3) 22 Março
Ana Catarina, Filipe Marques, Isabel Burgo, Tânia Almeida

4) 29 Março
Diana Paulo, Joana Barão, Márcia Bernardo

5) 5 Abril
Sara Fernandes, Filipe Gomes, Luís Monteiro, Rita Bárbara

6) 12 Abril
Bruno Jacinto, Pacheco Eduardo, Ricardo Rodrigues, Diogo Esteves

7) 3 Maio
Denilson Freitas, Cátia Ferreira, Inês, Vânia

8) 10 Maio
 Helga Costa, Catarina Príncipe, Rafael Martins, Rodrigo Pereira

9) 17 Maio
António Seabra, Marcos Guedes, Paulo Rodrigues

10) 24 Maio
Cristina Branco, Claúdia Ramalhosa, Joana Leotte
Aos que amam fazer amor com as palavras...




Um
Inspirado
Dia Mundial Da Poesia!

nº 41314

18/03/11

Conto Individual - Filipe Gomes

Como a professora sugeriu, vou pôr o meu conto no blog. Aqui vai.
Jon
De chapéu na mão, o dedo na campainha, ele olha para cima ao ouvir o som e vê o destino a vir ao seu encontro. Tinha a forma de um piano. Loyd Jon Benington atirou-se para a segurança dos arbustos que rodeavam a casa. O piano caiu onde ele à momentos estivera, quebrando-se numa explosão de madeira, libertando o seu grito agonizante de morte. Loyd Jon levantou-se e sacudiu a terra e as folhas das suas roupas. A porta da casa abriu-se pouco depois e Loyd Benginton II emergiu, observando a cena com um ensaiado ar de consternação. “Cruzes credo, Jon. Mas o que se passou aqui, meu velho?” “Ah, responde Loyd Jon, não lhe sei dizer, meu caro. Ouvi um som peculiar e quando olhei para cima vi este instrumento prestes a desabar sobre a minha pobre cabeça.” “Mas que acidente aleatório inesperado!, prosseguiu Loyd Benington. Estávamos precisamente agora a tirar o piano lá de cima para metermos o novo. A corda deve ter-se partido. Folgo em ver que estás bem, irmão! Entra, entra!” Loyd Jon olhou para cima e notou a notável ausência de cabos e roldanas. Apenas a janela da varanda aberta e dois senhores que, espreitando rapidamente lá para baixo, refugiaram-se imediatamente dentro da casa mais uma vez.
Loyd Jon entrou e o mordomo conduziu-o até à sala de refeições, onde Loyd e Vanessa já se encontravam. Loyd pôs-se imediatamente a contar o incidente à sua esposa. Vanessa sorriu. “O nosso Jon teve sorte que o piano o avisou, não é verdade?” Loyd Jon devolveu-lhe o sorriso. “Deveras. Mas, irmão, com tudo isto nem tivémos oportunidade de nos cumprimentarmos convenientemente. Isso não pode ser!” Loyd Jon rodou discretamente o seu anel, o que fez com que uma pequena agulha surgisse na superficie dourada do acessório. Esticou a mão a Loyd que se aproximou com a sua estendida para a apertar, mas, no ultimo instante, um olhar de horror passou pelo rosto de Loyd, como se se tivesse apercebido. Rapidamente afastou a sua mão direita e agarrou a de Loyd Jon pelas costas com a esquerda. “Um aperto de mão que aprendi na nossa ultima excursão às terras do sul. È um cumprimento utilizado pelos membros de uma tribo remota para mostar afecto aos que lhes são mais próximos, não é verdade querida?” Deslumbrante no seu vestido branco e azul, com o seu colar de safiras que combinava tão bem com o seu sedoso cabelo vermelho, Vanessa parecia divertida com a cena. “Gostei muito de conhecer essa tribo. Deviamos visitá-la outra vez na nossa próxima viajem.” Loyd Jon desconfiava que não existia nenhuma tribo nas terras do sul com tal cumprimento, mas não ia insultar o seu irmão e a sua bela esposa. “Sinto-me tocado que me tenhas em tão alta consideração, irmão.” Seguidamente beijou Vanessa nas faces antes de se sentar à mesa. O seu assento era directamente oposto ao de Loyd. Eles olharam-se de maneira avaliadora durante alguns segundos, sem que nenhum dissesse alguma coisa.
Loyd Jon esticou a mão para o seu guardanapo e parou antes de o agarrar. O guardanapo estava bem enrolado, em forma de tubo. Pegando na faca, Loyd Jon empurrou-o para o chão. Abriu-se e um pequeno escorpião, vendo-se livre, correu rapidamente em busca de uma saida ou, talvez, de alguém para picar. O mordomo avançou rapidamente e esmagou o infeliz aracnideo com o seu sapato. Depois, como se nada de estranho tivesse ocorrido, puxou uma das cordas que pendiam do tecto para chamar uma criada. “Oh, esses bichos aparecem em todo o lado, disse tristemente Loyd. È o problema de se viver no campo.” “Hoje parece que só ando a evitar desastres, observou alegremente Loyd Jon.” “Sinto-me um péssimo anfitrião, lamentou-se Loyd. Primeiro o piano e agora isto.” Loyd Jon pegou no copo de água e levou-o aos lábios enquanto o irmão falava. O suave tecido que cobria a mesa foi perturbado por uma mão que emergiu de debaixo da dita superficie de refeições e deixou cair um pequeno objecto no sitio onde, à meros segundos, estivera o copo de água. Loyd Jon inclinou-se para a frente para examinar o objecto. Parecia ser um comprimido. “A ultima coisa que eu quero, prosseguiu Loyd, é que te sintas pouco à vontade.” Ouviu-se um “Argh!” vindo de debaixo da mesa, um som semelhante ao que alguém produziria se se visse inesperadamente pontapeado. A mão voltou a emergir, tacteou bruscamente a superficie da mesa até encontrar o comprimido, agarrou-o e voltou a esconder-se. “Ratos, disse Loyd. Ainda a semana passada mandei vir o extermindador. É o campo.” “É o campo, ecoou Loyd Jon. Mas, por mais defeitos que tenha, não deixa de ser belo. Vivemos ambos perto da natureza e, ainda mais importante, da nossa riqueza. Espero que o teu convite para uma galopada pelas tuas terras ainda se mantenha Loyd.” “Então não, Jon? Assim que acabarmos de comer, vamos logo. Já mandei preparar os animais. Não há nada melhor para fazer a digestão.” Os criados trouxeram os pratos. Uma criada limpou o cadáver do escorpião. “Mandei o meu cozinheiro preparar o teu prato preferido, anunciou Loyd. Espero que esteja a teu gosto.” Loyd Jon observou o prato de carne fumegante com suspeita. “Oh, não. Pensei que te tinha dito.” “Dito o quê?” “O meu médico proibiu-me de comer carne. Estou de dieta meu caro. È o que acontece quando não cuidamos da nossa alimentação. Estás a comer o quê? Sopa de legumes? Ora ainda bem.” Loyd Jon levantou o seu prato com cuidado e veio pô-lo à frente de Loyd. Voltou para o seu lugar levando a sopa de Loyd, que prontamente começou a comer. “Que delicia. Que tal está a carne, Loyd?” O anfitrião olhou para ele com ódio profundo. Durante um segundo, foi para Jon como se visse o rosto do pai. Mas a pouco e pouco a sua expressão suavizou-se e voltou a ser o seu irmão. “Na verdade não tenho muita fome. E se fossemos dar a volta agora? Isso abre-me sempre o apetite!” Vanessa levantou o olhar do seu prato. “Os meninos portem-se bem! Nada de traquinices.” Eles riram-se. Loyd Jon pôs-se de pé. “Por mim tudo bem. Importas-te que eu vá primeiro à casa de banho? Podes ir já esperar por mim lá fora.” Loyd observou-o com desconfiança. “Está bem. È ao fundo do corredor. Mas não te demores.”
Loyd Jon dirigiu-se à casa de banho. Ligou a torneira e lavou a cara com água fria. As suas mãos não lhe deixaram o rosto. Inclinou-se lentamente até a sua cabeça pousar sobre o espelho do lavatório. O seu corpo estremeceu com um soluço repentino, ao que se seguiram outros dois. O som da porta da casa de banho a abrir fê-lo endireitar-se repentinamente e virar-se para encarar o intruso. “Espero não estar a interromper”, disse Vanessa, sempre deslumbrante. Loyd Jon esfregou rapidamente a cara com a toalha. “Não, claro que não. Como poderia eu ressentir-me da tua presença?”, disse ele todo sorridente. Vanessa avançou, agarrou-lhe a nuca com uma mão e trouxe-o até si, beijando-o nos lábios. Ele agarrou-a pela cintura e devolveu o beijo. “Sabes que só um de vocês é que vai voltar, avisou ela, subitamente muito séria. Desta vez não te podes limitar a evitar o destino.” “Eu sei.” Vanessa afastou-se dele e levantou a saia. Tinha uma pistola presa na sua meia-liga. Entregou-lha, e uma caixa de munições. “Só para equilibrar as hipóteses.” Sussurou ela antes de lhe virar as costas e sair da casa de banho. Loyd Jon carregou o revolver e guardou a caixa. Escondeu a arma no seu bolso interior, inspirou fundo e saiu. Enquanto caminhava, tentou perceber como é que tudo chegara a este ponto. Ele e Loyd alguma vez se zangaram quando eram pequenos? Alguma vez se odiaram? Não. Sempre foram próximos. Isso mudara lentamente à medida que cresciam. Qual foi a causa? É claro. O pai. Loyd Benington I. Ele lembrava-se. Era a memória mais nitida da sua infância. Cada vez que ele partilhara algo com o seu irmão, cada vez que se riram juntos de algo, cada vez que mostraram afecto um pelo outro, o rosto de Loyd Benington I surgia, desaprovador. Toda a sua vida o pai instigara-o a competir com o irmão e vice-versa. Era natural que se tivessem afastado com o passar do tempo. Porque é que ele tinha feito isto? Impossivel perguntar-lhe, morrera há vários anos, deixando metade das suas terras a Loyd e a outra metade a Loyd Jon. A sua ultima incitação ao conflicto fraternal. Desde então que não passara pela cabeça de Loyd outra coisa senão tornar-se dono de todas as terras que foram do seu pai. Seria isto o que o Loyd pai queria? Loyd Benington I foi um homem de negócios impiedoso, obcecado em tornar-se cada vez mais rico. A dada altura terá percebido que não viveria para sempre. Eis, então, o seu desejo. Um legado. A sua demência sobrevive através da sua prógene. Mas para isso só precisava de um filho.
Loyd Jon saiu para o ar puro. Loyd esperava ao pé da sua montada, um dinossauro bipede com ar tranquilo. “Tomei a liberdade de mandar preparar a tua montada, irmão. Uma das minhas melhores!” Loyd Jon observou o outro dinossauro. Eram precisos sete homens a segurá-lo com cordas. A sua boca aberta mostrava dentes afiados e os seus olhos uma loucura bastante humana. “Aquilo a sair-lhe da boca é espuma?” Loyd ignorou a pergunta. “Vamos então?” “Sim, mas se me deres licença, trouxe a minha própria montada.” Loyd Jon assobiou e o dinossauro que o trouxe até à mansão do irmão veio imediatamente ter com ele, esfregando o seu focinho na face do dono. “Mas esse animal trouxe-te cá! Deve estar exausto!” “Disparate, rematou Loyd Jon, a minha casa não é assim tão longe. E o Trincas é muito forte, ainda tem muita energia.” Loyd encolheu os ombros e montou, enquanto que os seus homens levavam o dinossauro espumoso de volta ao estábulo. “O Paul e Stevenson vêm connosco, anunciou Loyd. Para zelarem pela nossa segurança.” Loyd Jon observou os dois acompanhantes. Ambos estavam já montados em dinossauros velozes, e ambos traziam espingardas e olhares ferozes. Loyd Jon viu nas suas expressões o seu destino. Mas se alguma coisa acontecesse a Loyd, eles sabiam quem é que passaria a pagar os seus salários. Loyd Jon apertou o peso reconfortante da pistola no seu bolso e incitou Trincas a correr atrás da montada de Loyd. Lembrou-se de correr atrás de um rapaz parecido com ele e uma lágrima escorreu-lhe pela face abaixo.
- Filipe Gomes Nº41527

09/03/11

Carta a um jovem poeta

"Paris, 17 de Fevereiro de 1903
 
Prezadíssimo Senhor,
Sua carta alcançou-me apenas há poucos dias. Quero agradecer-lhe a grande e amável confiança. Pouco mais posso fazer. Não posso entrar em considerações acerca da feição de seus versos, pois sou alheio a toda e qualquer intenção crítica. Não há nada menos apropriado para tocar numa obra de arte do que palavras de crítica, que sempre resultam em mal entendidos mais ou menos felizes. As coisas estão longe de ser todas tão tangíveis e dizíveis quanto se nos pretenderia fazer crer; a maior parte dos acontecimentos é inexprimível e ocorre num espaço que nenhuma palavra nunca pisou. Menos suscetíveis de expressão do que qualquer outra coisa são as obras de arte — seres misteriosos cuja vida perdura, ao lado da nossa, efêmera.
Depois de feito este reparo, dir-lhe-ei ainda que seus versos não possuem feição própria, somente acenos discretos e velados de personalidade. É o que sinto com maior clareza no último poema, "Minha Alma". Aí, algo de peculiar procura expressão e forma. No belo poema "A Leopardi" talvez uma espécie de parentesco com esse grande solitário esteja apontando. No entanto, as poesias nada têm ainda de próprio e de independente, nem mesmo a última, nem mesmo a dirigida a Leopardi. Sua amável carta que as acompanha não deixou de me explicar certa insuficiência que senti ao ler seus versos, sem que a pudesse definir explicitamente. Pergunta se os seus versos são bons. Pergunta-o a mim, depois de o ter perguntado a outras pessoas. Manda-os a periódicos, compara-os com outras poesias e inquieta-se quando suas tentativas são recusadas por um ou outro redator. Pois bem — usando da licença que me deu de aconselhá-lo — peço-lhe que deixe tudo isso. O senhor está olhando para fora, e é justamente o que menos deveria fazer neste momento. Ninguém o pode aconselhar ou ajudar — ninguém. Não há senão um caminho. Procure entrar em si mesmo. Investigue o motivo que o manda escrever; examine se estende suas raízes pelos recantos mais profundos de sua alma; confesse a si mesmo: morreria, se lhe fosse vedado escrever? Isto acima de tudo: pergunte a si mesmo na hora mais tranqüila de sua noite: "Sou mesmo forçado a escrever?" Escave dentro de si uma resposta profunda. Se for afirmativa, se puder contestar àquela pergunta severa por um forte e simples "sou", então construa a sua vida de acordo com esta necessidade. Sua vida, até em sua hora mais indiferente e anódina, deverá tornar-se o sinal e o testemunho de tal pressão. Aproxime-se então da natureza. Depois procure, como se fosse o primeiro homem, dizer o que vê, vive, ama e perde. Não escreva poesias de amor. Evite de início as formas usuais e demasiado comuns: são essas as mais difíceis, pois precisa-se de uma força grande e amadurecida para se produzir algo de pessoal num domínio em que sobram tradições boas, algumas brilhantes. Eis por que deve fugir dos motivos gerais para aqueles que a sua própria existência cotidiana lhe oferece; relate tudo isso com íntima e humilde sinceridade. Utilize, para se exprimir, as coisas de seu ambiente, as imagens de seus sonhos e os objetos de suas lembranças. Se a própria existência cotidiana lhe parecer pobre, não a acuse. Acuse-se a si mesmo, diga consigo que não é bastante poeta para extrair as suas riquezas. Para o criador, com efeito, não há pobreza nem lugar mesquinho e indiferente. Mesmo que se encontrasse numa prisão, cujas paredes impedissem todos os ruídos do mundo de chegar aos seus ouvidos, não lhe ficaria sempre sua infância, essa esplêndida e régia riqueza, esse tesouro de recordações? Volte a atenção para ela. Procure soerguer as sensações submersas desse longínquo passado: sua personalidade há-de reforçar-se, sua solidão há-de alargar-se e transformar-se numa habitação entre lusco e fusco diante da qual o ruído dos outros passa longe, sem nela penetrar. Se depois desta volta para dentro, deste ensimesmar-se, brotarem versos, não mais pensará em perguntar seja a quem for se são bons. Nem tão pouco tentará interessar as revistas por esses seus trabalhos, pois há-de ver neles sua querida propriedade natural, um pedaço e uma voz de sua vida. Uma obra de arte é boa quando nasceu por necessidade. Neste caráter de origem está o seu critério — o único existente. Também, meu prezado senhor, não lhe posso dar outro conselho fora deste: entrar em si e examinar as profundidades de onde jorra a sua vida; na fonte desta é que encontrará a resposta à questão de saber se deve criar. Aceite-a tal como se lhe apresentar à primeira vista sem procurar interpretá-la. Talvez venha significar que o senhor é chamado a ser um artista. Nesse caso aceite o destino e carregue-o com seu peso e sua grandeza, sem nunca se preocupar com recompensa que possa vir de fora. O criador, com efeito, deve ser um mundo para si mesmo e encontrar tudo em si e nessa natureza a que se aliou.
Mas talvez se dê o caso de, após essa descida em si mesmo e em seu âmago solitário, ter o senhor de renunciar a se tornar poeta.
(Basta, como já disse, sentir que se poderia viver sem escrever para não mais se ter o direito de fazê-lo). Mesmo assim, o exame de consciência que lhe peço não terá sido inútil. Sua vida, a partir desse momento, há-de encontrar caminhos próprios. Que sejam bons, ricos e largos é o que lhe desejo, muito mais do que lhe posso exprimir.
Que mais lhe devo dizer? Parece-me que tudo foi acentuado segundo convinha. Afinal de contas, queria apenas sugerir-lhe que se deixasse chegar com discrição e gravidade ao termo de sua evolução. Nada a poderia perturbar mais do que olhar para fora e aguardar de fora respostas a perguntas a que talvez somente seu sentimento mais íntimo possa responder na hora mais silenciosa.
Foi com alegria que encontrei em sua carta o nome do professor Hoaracek; guardo por esse amável sábio uma grande estima e uma gratidão que desafia os anos. Fale-lhe, por favor, neste sentimento. É bondade dele lembrar-se ainda de mim; e eu sei apreciá-la.
Restituo-lhe ao mesmo tempo os versos que me veio confiar amigavelmente. Agradeço-lhe mais uma vez a grandeza e a cordialidade de sua confiança. Procurei por meio desta resposta sincera, feita o melhor que pude, tornar-me um pouco mais digno dela do que realmente sou, em minha qualidade de estranho.
 
Com todo o devotamento e toda a simpatia,
 
Rainer Maria Rilke"

 
(Esta "Primeira Carta" do livro Cartas a um jovem poeta foi traduzida por Paulo Rónai)

06/03/11

CONTO colectivo

Queridos alunos:

É imperativo colocarem os nomes dos membros do vosso grupo no post
(http://ecriativa-flul.blogspot.com/2011/02/grupos-de-trabalho-conto-colectivo.html),
pela ordem que desejam continuar a história, de modo a podermos contabilizar as semanas e continuar o conto (vs. deixá-lo morrer!). Avisem-se uns aos outros, por favor.


TERCEIRO grupo (quem quer que sejam!), por favor continuem a partir do texto já disponível, de modo a que na próxima sexta-feira possamos já passar a luz ao quarto grupo.


Grata.

02/03/11

Sugestão

Amigos,

esta 5ª feira às 14:30, e na madrugada de 5ª para 6ª às 5:00 passa, no canal Hollywood, o filme Wonder Boys- Os Prodígios.

Esta película que saiu em 2000, realizada pelo aclamado Curtis Hanson ( que dirigiu o soberbo L.A Confidential), desenrola-se numa universidade de Pittsburgh e tem como personagem principal um professor de... escrita criativa, Grady Tripp.

Para sermos rigorosos, o filme não é sobre o processo da escrita criativa, ele fala-nos de segundas oportunidades, de laços improváveis, da amizade.

O professor, desempenhado por Michael Douglas, atravessa um período complicado da sua vida pessoal e profissional (ele é também escritor), ao mesmo tempo que tenta servir de mentor a um dos seus frágeis alunos, James Leer (Tobey Maguire) cuja short-story é destruída, no início do filme, por uma colega com o comentário : "Jesus, what is it with you catholics!"

O filme é baseado no romance homónimo (1995) do jovem escritor americano Michael Chabon que tirou o curso de escrita criativa (sim, isso existe) em Pittsburgh, onde seguramente recolheu o material para este romance.

A personagem de Grady Tripp é inspirada num professor de escrita, que teve como aluno Raymond Carver, de quem já falámos várias vezes (eu não consigo confirmar isto, façam vocês a pesquisa e depois digam-me alguma coisa sff).

Resta-me dizer que a banda sonora é magnífica conta com Leonard Cohen e com duas (sim, duas) canções de Bob Dylan.

Aqui têm o trailer do filme: http://www.youtube.com/watch?v=sveK_fhIqhs

Para uma boa introdução a Michael Chabon recomendo esta colecção de short-stories:
http://www.goodreads.com/book/show/16699.A_Model_World_and_Other_Stories

O posfácio do seu primeiro romance, que foi o seu trabalho final de curso, aborda a questão das dificuldades de um aspirante a escritor, podem encontrá-lo nesta edição:
http://www.goodreads.com/book/show/16697.The_Mysteries_of_Pittsburgh

I wanted to write something with reach. Welty and Faulkner started and ended in small towns in Mississippi but somehow managed to plant flags at the end of time and in the minds of readers around the world.

Se quiserem utilizem a caixa de comentários para verbalizar as vossas opiniões sobre o filme.

Um grande bem-haja,

aluno nº37965

Conto Colectivo - Parte I (Revisto)

Nunca irei esquecer aquela tarde em Guadalupe. Sinto o cheiro adocicado da feira, o sol na pele e oiço o vozear. Consigo cheirá-lo, senti-lo e ouvi-lo como se estivesse ao meu lado. Miguel era tudo o que eu desejara e bastante mais. Nos meus vinte anos nunca conhecera um homem como ele. Recordo bem o seu rosto: uma ligeira preocupação enrugava-lhe a testa, o sobrolho franzido adivinhando conspiração. Nos seus olhos negros os enigmas do universo, na sua boca um segredo vital. Deixou-me deslumbrada.

Com o primo António nunca foi assim. O meu marido era um homem de bem, dedicado aos negócios, aos amigos e ao mundo. O nosso casamento era um contrato bem sucedido. E que mulher não desejaria um homem estável?

O primo rodeava-se de livros de economia, mantendo-se em constante aprendizagem, escrevinhando, sempre que estava em casa, no que gostava de chamar "o meu livro de contas". Também Miguel escrevia, palavras que nunca li.

Nunca entendi a qual dos dois se destinavam as palavras da bruxa.

01/03/11

Michael Cunningham na FLUL

O escritor Michael Cunningham, autor de As Horas, Ao Cair da Noite e Sangue do meu Sangue, estará na FLUL no dia 9 de Março, para proferir uma conferência intitulada "Found in Translation", que terá lugar na Sala 5.2, às 11h.

A iniciativa é uma organização do ICI-Instituto de Cultura Inglesa e do ICA-Instituto de Cultura Americana, em colaboração com Gradiva Publicações