O vidente finalmente atendeu, perguntando o meu nome e o que eu gostava de saber do meu futuro. Ia dizer que havia me casado com alguém por conveniência e que amava secretamente outro homem, mas então olhei-me no espelho e de repente senti-me ali um tanto patética. Fiquei envergonhada e resolvi inventar o que me viesse à cabeça. Disse que me chamava Maria e que havia escolhido uma profissão que me pagava bem, mas eu gostava mesmo era de ser arqueóloga, então o que faço, fico no meu porto seguro ou lanço-me num mar desconhecido? O vidente ouviu a minha dúvida e ficou por alguns segundos pensativo, como se estivesse a captar uma mensagem do além, em seguida olhou para a câmara com um olhar penetrante e disse a enigmática frase: "Olhos cegos podem ver". Foi então que acordei.
As costas doíam-me e o pescoço estava dorido, não sei porque é que insistia em deitar-me naquele sofá. Levantei-me para espreitar o frigorífico mas estava vazio. Eram três da manhã, bebi um copo de água e enfiei-me na cama. Deitada, olhava para o tecto e murmurava uma canção inventada. De repente tive um ataque de riso com gargalhadas soltas e profundamente genuínas. Apercebi-me do quão ridículo aquele sonho fora... O poder do subconsciente actuando num universo místico de sonhos de televisão.
Senti-me desperta e com vontade de fazer alguma coisa. Peguei num livro para ver se o sono voltava, mas não consegui passar da quinta linha. Pousei o livro e recomecei a pensar no que a vidente me dissera. Teria de facto tentado enganar o destino, ou será que ao fugir do “suposto” destino, tinha ido de encontro ao que me estava realmente destinado?
Vencida pelos pensamentos, decidi levantar-me e ir até à varanda apanhar ar. Reflecti um pouco mais sobre os desígnios da vida, as previsões da vidente. Estaria a fazer uma leitura errada? Seria possível ter renunciado à felicidade que esteve sempre ao meu alcance por causa dos desígnios da cigana?
Peguei no telefone para ligar ao António. Lá já era de manhã, ele provavelmente estaria atarefado, mas por sorte atendeu rapidamente, com aquela voz rouca que me é tão familiar.
Denilson Freitas da Silva (45156)
Maria Inês Sousa (31223)
Cátia Ferreira (39071)
Olá Grupo VII,
ResponderEliminarGostei da vossa versão e imaginação revelada na continuação deste conto colectivo. Nada tenho a acrescentar em termos estilísticos. O que não me tem agradado ao longo das varias versões é a caracterização psicológica da personagem “Maria” que se tem vindo a desenvolver . “Maria” é uma personagem dos anos 70, abastada, presumivelmente educada, sofisticada, aparentemente sem interesses reais ou sequer uma ocupação saudável. De facto, esta "Maria" que inicialmente se revelou corajosa e disposta à acção, questionando o seu casamento, a partir daí torna-se uma pessoa passiva, à deriva das suas dúvidas. Claro que todos têm direito a momentos de fraqueza e a tudo pôr em causa, mas há limites. Sem dúvida, a ilusão é parte integrante do ser humano e não escolhe idades mas, perante a necessidade de busca de um caminho de vida ninguém, no seu perfeito juízo, entrega as dúvidas e as decisões que tem de tomar ao longo da vida nas mão de videntes e mais videntes.
Vamos ver que decisões tomará esta “Maria”, tão passiva, relativamente a uma escolha de modo de vida que não dependa de ninguém senão de si mesma.
Aluna nº 37679
Devo confessar que gostei desta parte do conto colectivo. Apesar de achar que a personalidade forte de "Maria" tem vindo a diminuir ao longo das diversas partes do conto, creio que ainda vimos aqui um pequeno vislumbre da força que reside nela, com o ataque de gargalhadas que ela teve e com o facto de, ainda que apenas por uns breves instantes, ela ter achado toda aquela situação ridícula. No entanto, não gostei muito da decisão de Maria ir ligar a António, pois não entendo o que a levaria a fazer tal coisa, visto que ela supostamente "fugiu" daquele casamento para ir procurar respostas.
ResponderEliminarA nível do texto, sugeria ainda a mudança desta passagem: "Ia dizer que havia me casado com alguém por conveniência e que amava secretamente outro homem, mas então olhei-me no espelho e de repente senti-me ali um tanto patética." para: "Ia dizer que eu tinha casado com alguém por conveniência e que amava outro homem em segredo, mas depois olhei para o meu reflexo no espelho e senti-me um pouco patética.", a fim de não se repetir tantas vezes o pronome "me".
41131
Concordo com os comentários anteriores e até por isso houve essa necessidade de ironizar,de ridicularizar a situação. O problema é que, ás vezes, nem dentro do próprio grupo há coerência, porque claramente até metade desta parte a personagem estava a querer se desembrulhar do mundo absorvente e esotérico em que se tinha arrastado. houve um momento nesta parte do conto em que ela, consegue se rir da situação e quase partir para outra. Na verdade até tinha sugerido que ela partisse para outra, largasse estes pensamentos e começasse a dedicar-se a ela própria mas o facto foi que isso acabou por ser rejeitado e voltou-se à questão inicial sobre as decisões do passado. de qualquer modo, acho que esta parte ainda vai a tempo de criar uma ponte para a tal mudança. Ela pode ligar ao primo para dizer que não volta mais e que vai em busca de si própria. Pode ligar e desligar e não dizer mais nada, há um universo de possibilidades que podem ser acrescentadas! :)
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