Aqui vai a primeira página do nosso conto colectivo. Esperemos que gostem.
Nunca mais me irei esquecer daquela tarde em Guadalupe. Se fechar os olhos com força quase que consigo cheirar o odor adocicado da feira, ouvir o ruído das vozes de feirantes e turistas e sentir o calor do sol na pele. Se fechar os olhos com força quase consigo cheirá-lo, ouvi-lo e senti-lo como se ele estivesse ao meu lado. Miguel era tudo o que eu sempre desejara e bastante mais. Nos meus vinte anos nunca conhecera um homem como ele: belo, exótico e misterioso. Acima de tudo misterioso. Recordo-me nitidamente do seu rosto, de todos os seus traços faciais. Um traço de preocupação rompia constantemente a sua testa, mantendo sempre o sobrolho franzido como se o mundo contra ele conspirasse. Amá-lo era como saltar de um trapézio sem rede. Nos seus olhos negros eu via encerrados todos os enigmas do universo e na sua boca um segredo mortal. Mais tarde descobriria o quanto isso era verdade.
Agora que penso nisso, não compreendo como não me tinha apercebido da estranheza daquele homem. Ou talvez tivesse e simplesmente não queria saber. Dizem que o maior cego é aquele que não quer ver e, naquela altura, eu era a maior cega que caminhava em Guadalupe. Tudo o que Miguel me dissesse para fazer, eu fá-lo-ia sem hesitar. Com o primo António nunca fora assim. Nem naqueles anos seguintes ao nosso casamento nem em nenhum momento da nossa vida. O meu marido sempre fora um homem de bem, dedicado aos negócios, aos amigos e ao mundo. Ainda assim, a sua dedicação não chegava à minha pessoa. Todavia, era um homem estável; e que mulher não quereria um homem estável?
O primo António rodeava-se de todos os livros de economia, mantendo-se sempre em constante aprendizagem, escrevinhando, sempre que estava em casa, no que gostava de chamar “o seu livro de contas”. Miguel também escrevia quase constantemente, apesar de fazer questão para que eu nunca o incomodasse enquanto o fazia. É o único ponto comum que consigo encontrar entre os dois homens que me preencheram a vida. Nunca entendi a qual dos dois se destinava as palavras da bruxa.
Fábio Cruz
Pedro Candeias
Susana Correia
Que difícil tarefa os colegas nos deixaram, a nós, grupo seguinte, a de continuar esta história, cada vez mais estruturada...
ResponderEliminar"Nunca entendi a qual dos dois se destinava as palavras da bruxa."
Penso que ao invés desta frase terminar o texto deveria, antes, ser o início da continuação do conto. Assim, o leitor entederia logo que havia outro homem na vida da prsonagem central além do António, o Miguel. Fica a sugestão...
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*personagem
ResponderEliminarAgradavelmente redigido, bom trabalho na pormenorização do espaço e das personagens, não obstante, deixando o seguimento da actual história em aberto. Um exórdio interessante, cujo objectivo deduzo ser familiarizar o leitor tanto com as personagens do conto como - principalmente - a opinião da protagonista acerca destas.
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